Paulo Werneck
Alvará de 28 de maio de 1808, que cria o estanco de cartas de jogar.
ALVARÁ de 28 de Maio de 1808
Eu o Principe Regente faço saber aos queeste Alvará com força de lei virem, que tendo consideração ao quanto convém nas actuaes circumstancias augmentar as Rendas Reaes, para com ellas acudir ás urgentes necessidades do Estado; e convindo tambem lançar mão de meios já conhecidos, e de impostos cuja cobrança e arrecadação tem mostrado a experiencia não ser difficultosa ou pesada, antes pelo contrario facil e suave aos meus fieis vassallos: e que de ficarem por Estanco as cartas de jogar resulta interesse á minha Fazenda, tendo este methodo a vantagem de fazer entrar nos meus reaes cofres a porção dada pelo contractador sem os desperdicios das Administrações: sou servido determinar que as cartas de jogar fiquem nesse Estado e nos meus Dominios Ultramarinos por Estanco; e que só o contractador a quem eu houver de arrendar este contracto, possa fabrical-as, ou vendel-as, ou as pessoas que tenham delle faculdadade para o fazer; e que se proceda á competente arrematação, mandando-se affixar editaes nesta Capital para concorrerem as pessoas que quizerem lançar, arrematando-se a quem offerecer maior quantia e mais razoadas condições.
E este se cumprirá, como nelle se contém. Pelo que mando á Mesa do Desembargo do Paço, e da Consciencia e Ordens; Presidente do Real Erário; Regedor da Casa da Supplicação do Brazil; Governador da Relação da Bahia; Governadores e Capitães Generaes, e mais Governadores do Brazil, e dos meus Dominios Ultramarinos; e a todos os Ministros de Justiça, e mais pessoas, a quem pertencer o conhecimento e execução deste Alvará, que o cumpram e guardem e façam cumprir e guardar tão inteiramente, como nelle se contém, não obstante quaesquer Leis, Alvarás, Regimentos, e Decretos, ou Ordens em contrario; porque todos e todas hei por bem por derogadas para este effeito sómente, como se delles fizesse expressa e individual menção, ficando aliás sempre em seu vigor. E este valerá como carta passada pela Chancellaria, ainda que por ella não ha de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno, sem embargo da Ordenação em contrario: registando-se em todos os logares, onde se costumam registar semelhantes Alvarás. Dado no Palácio do Rio de Janeiro em 28 de Maio de 1808.
PRINCIPE com guarda.
D. Fernando José de Portugal.
Alvará por que Vossa Alteza Real ha por bem ordenar que se ponham por Estanco as cartas de jogar no Estado do Brazil, e Dominios Ultramarinos, na fórma acima declarada.
Para Vossa Alteza Real ver.
João Alvares de Miranda Varejão o fez.
Comentários
Este Alvará também foge ao tema do blog, mas foi incluído por mostrar de modo muito claro como funcionava o Estanco e qual o papel do contratador, também utilizado na arrecadação de tributos.
Corria o início de 1808. Dom João, após longa maturação de idéias, fugiu, ops, transferiu a sede do Reino de Portugal para o Rio de Janeiro. Certamente tinha precisão de dinheiro. Daí, aproveitando-se do fato de não haver garantias constitucionais que protegessem o contribuinte, disparou dois Alvarás em 28 de maio, um tributando o fumo de rolo, também disponível neste blog, e este criando o estanco, ou seja, o monopólio, no caso de produção e venda de baralhos.
No entanto, não era, nem nunca foi, intenção do Príncipe Regente se envolver na indústria e comércio de cartas de baralho, antes vender esse seu direito exclusivo, recém criado, pelo melhor preço, e quem viesse a ganhar a licitação, o contratador, é que iria, com exclusividade, trabalhar em tal atividade, pagando ao Erário Real por essa benesse.
Também existiam contratadores para a arrecadação de tributos, que pagavam uma soma fixa, determinada na licitação, ao Erário, e cobravam de cada contribuinte o pagamento dos tributos estabelecidos, correndo por sua conta as despesas de administração e os riscos do negócio.
Referências
BRASIL. Colleccção das Leis do Brazil de 1808. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1891. Pags. 45-46.