sexta-feira, 28 de março de 2008

Alvará tributando tabaco de corda - 1808

Paulo Werneck

Alvará de 28 de maio de 1808, que estabelece o imposto de 400 réis por arroba sobre tabaco de corda.



Eu o Principe Regente faço saber aos que o presente Alvará com força de lei virem, que sendo necessario nas urgentes precisões em que se acha o Estado , estabelecer rendimentos que bastem para a despeza publica, pois que não podem chegar os que se achavam estabelecidos em mui diversas circumstancias; e desejando, não só que os impostos carreguem sobre os generos que pelos seus preços e consumo podem mais suavemente supportal-os, e sejam da menos oppressão possivel aos meus fieis vassallos, mas que tenham a maior facilidade na arrecadação, para nem haver desperdicios nos rendimentos delles, nem vexações e violencias no modo de arrecadal-os: e considerando que o tabaco de corda póde bem soffrer um moderado imposto sem damno dos que se empregam na sua lavoura, fabrico e commercio; e que sendo a taxa cobrada em Casas de Arrecadação já estabelecidas, não se multiplicam despezas, nem se dá logar a vexações na cobrança, vindo outrosim a resultar na pratica os proveitos da facilidade e suavidade que resultam dos impostos indirectos: sou servido determinar o seguinte:
Todo o tabaco que sahir da Casa da Arrecadação da Capitania da Bahia, vulgarmente chamada Peso de Fumo, para consumo della, pagará ao sahir 400 réis por arroba, arrecadando-se logo pellas pessoas que alli se acham empregadas, as quaes na escripturação, cobrança, e remessa aos meus reaes cofres se haverão pela maneira que lhes for determinada pela Junta da minha Real Fazenda daquella Capitania, a quem recommendo a maior simplicidade de methodo, que for compativel com a exactidão necessaria.
A mesma taxa pagará na Alfandega desta Cidade todo o tabaco em rolo, ou de corda, ou seja o chamado da Piedade, ou o de Maipendi, que vier por mar de qualquer Porto deste Estado, e der a competente entrada na Alfandega. E nella haverá, no expediente do despacho deste genero e na cobrança do imposto, o mesmo methodo que alli se pratica com os que são de peso.
O tabaco de rolo ou de corda que for importado por terra, pagará no registro de Taguahi o mesmo que se paga o que se importa por mar, por estar informado que as despezas são as mesmas; e aquelle registro se reputará Alfandega de Porto Secco. Nelle haverá uma balança para o peso e um livro rubricado pelo Desembargador Juiz da Alfandega desta Cidade, no qual farão a competente escripturação o Escrivão e Provedor do Registro, dando a necessaria guia ao despachante; e por esta fórma se tomará ao Provedor a devida conta no meu Real Erario todos os tres mezes, sendo por qualquer falta ou fraude castigados com as penas em que incorrem os que desencaminham minha Fazenda.
Todo o tabaco extraviado aos meus reaes direitos será apprehendido, e se praticará com elle, e seus donos, o que a respeito de outros generos se acha disposto no Alvará de 5 de Janeiro de 1785.
E este se cumprirá como nelle se contém. Pelo que mando à Mesa do Desembargo do Paço, e da Consciencia e Ordens; Presidente do meu Real Erário; Regedor da Casa da Supplicação do Brazil; Governador da Relação da Bahia; Governadores e Capitães Generaes, e mais Governadores do Brazil, e dos meus Dominios Ultramarinos; e a todos os Ministros de Justiça, e mais pessoas, a quem pertencer o conhecimento, e execução deste Alvará, que o cumpram e guardem e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nelle se contém, não obstante quaesquer Leis, Alvarás, Regimentos, Decretos ou Ordens em contrario, porque todos e todas hei por derogadas para este effeito sómente, como se dellas fizesse expressa e individual menção, ficando aliás sempre em seu vigor. E este valerá como carta passada pela Chancellaria, ainda que por ella não ha de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno, sem embargo da Ordenação em contrario: registrando-se em todos os logares, onde se costumam registar semelhantes Alvarás. Dado no Palacio do Rio de Janeiro em 28 de Maio de 1808.
PRINCIPE com guarda.
D. Fernando José de Portugal.
Alvará com força de Lei, pelo qual Vossa Alteza Real ha por bem estabelecer o imposto de 400 réis por arroba de todo o tabaco de corda, que sahir da Casa da Arrecadação da Bahia para consumo da mesma Capitania, e do que entrar nesta Cidade por mar ou por terra, na fórma acima declarada.
Para Vossa Alteza Real ver.
João Alvares de Miranda Varejão fez.

Comentários

Este Alvará não se enquadraria na seleção que preside à seleção dos documentos a serem incluídos neste blog, uma vez que se refere à imposição de um tributo interno sobre circulação de mercadorias, alheio portanto ao comércio exterior.
No entanto, traz alguns detalhes interessantes. Em primeiro lugar, mostra que a Alfândega, à época, não se caracterizava como uma repartição fiscal exclusivamente dedicada ao comércio exterior, que, aliás, só o podia ser entendido de forma suavizada, uma vez que, salvo exceções, as mercadorias que chegavam ao Estado do Brasil eram enviadas da Metrópole ou dos demais Domínios Ultramarinos do Reino de Portugal, ou, no sentido inverso, a esses lugares destinadas.
Mesmo assim, ao tributar a entrada do fumo de rolo "que vier por mar de qualquer Porto deste Estado", assume o papel de tributar comércio de cabotagem.
Aos leitores distraídos lembro que "este Estado" se referia ao conjunto das províncias do Brasil, não ao que hoje é o Estado do Rio de Janeiro.
Outro ponto interessante é a denominação de "porto seco" dada ao Registro de Taguahi (seria a atual Itaguaí?). Os registros e as contagens eram repartições fiscais colocadas em locais de passagem para que nelas fossem cobrados certos tributos referentes à circulação interna de mercadorias.
Finalmente, note-se a menção aos despachantes, que receberiam as necessárias guias fornecidas pelo Escrivão e Provedor do Registro...
Referências
BRASIL. Colleccção das Leis do Brazil de 1808. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1891. Pags. 43-45.